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domingo, 19 de abril de 2015

Teste diagnósticos


A proposta do rastreamento (screening, em inglês) de uma doença por meio de um teste diagnóstico é prevenir a doença ou suas consequências por meio da identificação de indivíduos em um ponto na história natural – ponto este que ocorre quando o processo da doença pode ser alterado por meio de intervenção. Há três níveis de prevenção que são alvos típicos em programas de rastreamento das doenças:
  1. Prevenção primária: os alvos deste tipo de prevenção são pessoas assintomáticas. É necessária para identificar fatores de risco para a doença com o objetivo de detectar o processo patológico antes do desenvolvimento dos sintomas. Por exemplo, identificar pessoas nos primeiros estágios de intolerância à glicose e controlar seu peso e dieta, com o intuito de prevenir o desenvolvimento do diabetes. 
  2. Prevenção secundária: os alvos são pessoas no início do processo da doença com o objetivo de melhorar o prognóstico. Por exemplo, identificar pessoas com diabetes não detectada ou não controlada com o intuito de melhorar a tolerância à glicose para evitar, entre outras coisas, doença microvascular que pode levar a patologias renais ou da retina. 
  3. Prevenção terciária: os alvos são os indivíduos que estão desenvolvendo complicações, com o intuito de evitar sequelas de tais complicações. Por exemplo, fazer avaliação de pessoas  com diabetes para detectar retinopatia decorrente desta doença, com o objetivo de utilizar tratamento a laser, para controlar hemorragias da retina e evitar a cegueira. 

Teste diagnóstico e rastreamento (screening)


Um teste diagnóstico é utilizado para identificar um marcador inicial de progressão da doença, para que intervenções possam ser implementadas e interromper o processo de progressão. De uma maneira geral, o rastreamento é feito somente quando as seguintes condições são cumpridas: 1.a doença é uma causa importante de mortalidade e/ou morbidade; 2. existe um teste provado e aceitável para detectar indivíduos em estágios iniciais e modificáveis; 3. existe tratamento seguro e efetivo disponível para prevenir a doença ou suas consequências.


Sensibilidade e Especificidade 


Existem duas probabilidades utilizadas para medir a habilidade de um teste diagnóstico para discriminar, entre os indivíduos, quais desenvolveram e quais não desenvolveram a doença. Essas medidas da validade do teste diagnóstico são determinadas comparando os resultados baseados nos testes diagnósticos com aqueles derivados de um teste mais definitivo, conhecido como “padrão ouro”. A medida para a qual os resultados do teste diagnósticos concordam com aqueles derivados do “padrão ouro” fornece uma medida de sensibilidade e especificidade.

Sensibilidade é a habilidade do teste diagnóstico de dar um resultado positivo naqueles que desenvolveram a doença. É uma porcentagem:

Sensibilidade = [(indivíduos doentes com testes positivos)/(indivíduos doentes)]

Pode parecer que a sensibilidade é tudo que se necessitaria de um teste. Se é possível identificar corretamente todos aqueles que desenvolvem a doença, certamente a sensibilidade é suficiente. Entretanto, é necessário que se incluam como positivos apenas aqueles indivíduos que estão desenvolvendo a doença. Dessa restrição decorre o conceito de especificidade. Especificidade é a habilidade do teste em gerar um resultado negativo quando os indivíduos testados não desenvolvem o desfecho de intereese. Também é expressa por uma porcentagem:

Especifidade = [(indivíduos não doentes com testes negativos)/(indivíduos não doentes)] 

O conceito de sensibilidade e de especificidade de um teste de diagnóstico podem ser entendidas mais facilmente por meio de um exemplo, tal como a prevenção secundária da cegueira pela detecção e tratamento precoce do glaucoma, uma doença que aumenta a pressão intraocular.

O investigador tem o problema de definir o ponto de corte ou a leitura acima da qual um paciente deve ser considerado como possível portador de glaucoma. Fica claro que para detectar todos os olhos glaucomatosos (para atingir 100% de sensibilidade), o ponto de corte deve ser 22 mm Hg. Esse nível resultará na detecção de todo o glaucoma, mas a contrapartida é incluir um número considerável de olhos normais, aqueles não glaucomatosos, de 22 a 27 mm Hg. Isso significa que a especificidade é menor do que 100%.

Agora vamos supor que se deseja excluir todos os olhos normais, ou seja, ter uma especificidade de 100% Claramente, isso implica a definição do ponto de corte em 27 mm Hg, de forma que todos os olhos normais serão excluídos e somente olhos glaucomatosos serão identificados. Entretanto, o compromisso que se faz com isso será que alguns glaucomas serão perdidos, ou seja, a sensibilidade será menor do que 100%.

Na prática, um novo compromisso é assumido, e o ponto de corte é fixado, por exemplo, em 24 mg Hg. Isso significa que a sensibilidade e a especificidade serão menores do que 100% e que os resultados falso-positivos e falso-negativos aumentarão, porém em pequena medida. Fica evidente que a sensibilidade e a especificidade não podem ser 100%, uma vez que as distribuições das populações saudável e doente se sobrepõem, no que diz respeito à variável que está sendo mensurada pelo teste diagnóstico.

Como o resultado do teste diagnóstico depende de somente um ponto de corte, a sensibilidade e a especificidade são medidas invariavelmente relacionadas. Em um único teste, a sensibilidade pode aumentar, mas somente em detrimento da especificidade e, similarmente, a especificidade pode aumentar desde que a sensibilidade diminua. O ponto de corte pode ser movido no território comum compartilhado pelos saudáveis e pelos doentes, e uma relação recíproca existe entre sensibilidade e especificidade.

A configuração real depende de considerações clínicas peculiares da doença em estudo. A história natural da doença e a efetividade da intervenção, cedo ou tarde, devem ser conhecidas.

Veja:
⇒ Se a doença é muito rara, a sensibilidade deve ser alta, então, os poucos casos presentes na população serão perdidos (fenilcetonúria é um exemplo).
⇒ Se a doença tem um período de latência em desenvolvimento, assintomático, mas ainda assim pode ser detectada por um teste diagnóstico e, com isso, melhorar o prognóstico o rastreamento é muito recompensador.
⇒ Se a doença é muito letal e a detecção precoce melhora muito o prognóstico, uma alta sensibilidade é necessária. Os cânceres, em geral, são exemplos nos quais resultados falso-positivos são toleráveis, mas falso-negativos não são.
⇒ Por outro lado, doenças de prevalência alta, cujo tratamento não altera significativamente os resultados, a especificidade deve ser alta, caso contrário a facilidade é oprimida pela demanda de diagnósticos em todos os resultados positivos, sejam eles verdadeiros ou falsos.

Resultados Falso-Positivo e Falso-Negativo (FP e FN) 

O clínico pensa em termos de resultados falso-positivos e falso-negativos. Um teste que é muito sensível tem poucos resultados falso-negativos; isso ocorre quando a sensibilidade se aproxima de 100%. Um teste com alta especificidade terá poucos resultados falso-positivos porque a especificidade é igual; isso ocorre quando a especificidade está próxima de 100%.

Valor Preditivo de um Teste Positivo (VPP), VPN e acurácia 

Observa-se que a proporção de testes positivos que são verdadeiros positivos é uma razão é conhecida como valor preditivo de um teste positivo. O valor preditivo de um teste positivo aumenta com o aumento da sensibilidade e da especificidade, como pode ser esperado. Mas se a prevalência da doença na população aumentar o valor preditivo de um teste positivo também aumenta, e o inverso é verdadeiro. Como populações de alto risco são frequentemente escolhidas para rastreamento, há aumento do rendimento e do valor preditivo de um teste positivo.

Analogamente, é possível calcular o valor preditivo de um teste negativo. Entretanto, uma vez que o principal objetivo de um teste diagnóstico é identificar aqueles indivíduos que têm a doença, essa não é uma medida utilizada frequentemente.

A acurácia é igual a (FP+FN)/total de indivíduos testados

Aceitabilidade 

Aceitabilidade de um teste diagnóstico é uma consideração prática. Por exemplo, um exame do muco cervical e mais aceitável do que um exame mais invasivo. Grupos de alto risco são frequentemente identificados como população alvo para programas de rastreamento; ainda, aceitação é muitas vezes menor entre aqueles com a maior probabilidade para a doença, por exemplo, os muito velhos ou aqueles com baixa escolaridade.

Fonte:  Richard F. Morton, John Richard Hebel, Robert J. McCarter. A Study Guide to Epidemiology and Biostatistics
Jones & Bartlett Learning, 2005 - 208 páginas

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